domingo, 16 de março de 2008

Reforma Ortográfica: surpreendidas, editoras querem adiamento

Associação do setor de didáticos vai se reunir com MEC para pedir prazo maior na aplicação da nova ortografia
O GLOBO / PROSA & VERSO Rio de Janeiro, 15 de março de 2008.
Miguel Conde


As editoras brasileiras foram apanhadas de surpresa pela exigência de que os livros inscritos no Plano Nacional do Livro Didático (PNLD) de 2010 estejam em conformidade com as normas do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. A mudança foi anunciada no último dia 7 no "Diário Oficial". O processo de inscrição e entrega das obras vai de 26 de maio a 4 de junho. - Estou entrando e saindo de reunião o dia inteiro por causa disso - diz Roberta Martins, editora de línguas da Scipione, uma das cinco principais fornecedoras do PNLD.

- É uma alteração grande, que vamos ter que fazer em cima da hora. Grande parte dos livros já estava pronta. Não sei se vamos conseguir entregar tudo no prazo. Nos livros de alfabetização é ainda mais complicado, porque aí temos que fazer também alteração no conteúdo

Mudança não afeta apenas setor de didáticos
A Associação Brasileira de Editoras de Livros (Abrelivros), que congrega os editores de didáticos, ainda espera conseguir uma prorrogação do prazo. O presidente da Abrelivros, Jorge Yunes, deve se reunir nos próximos dias com a cúpula do Ministério da Educação (MEC) para negociar a questão. Por enquanto, a Abrelivros prefere não se manifestar sobre o assunto. O aviso do MEC foi feito um dia após o Conselho de Ministros de Portugal emitir um voto em favor da ratificação do acordo, assinado em 1990 em Lisboa e até hoje não implementado.

Apesar de ser um sinal importante, a aprovação ainda precisa passar pelo Parlamento e pelo presidente do país europeu. Representantes dos ministérios da Educação do Brasil e de Portugal deverão se reunir nos próximos meses para definir o cronograma de transição. No Brasil, os livros didáticos são usados durante três anos. Em Portugal, esse prazo vai de quatro a seis anos. Portanto, é provável que cada país adote um cronograma diferente.

O assessor especial do ministério, Carlos Alberto Xavier, diz que haverá um período de transição, em que os alunos usarão ao mesmo tempo livros com a ortografia anterior ao acordo e livros com a nova ortografia: - É saudável que nas escolas existam livros de uma e outra forma, porque assim os alunos poderão descobrir que palavras como "vôo", por exemplo, tinham acento antes e depois deixaram de ter. Já foi assim na última reforma, em 1971. Será uma transição pacífica. A mudança não afeta apenas os editores de didáticos, mas também aqueles que publicam as chamadas "obras complementares", ou paradidáticos. Diretor- geral da Melhoramentos, uma das maiores empresas do setor, Breno Lerner acha que o aviso foi feito em cima da hora: - Em algum momento isso ia acontecer. Pena que esteja sendo dessa forma atabalhoada.

Editor não vê vantagens no acordo, mas o governo sim
O editor diz não ver nenhuma vantagem no acordo. - A curto e médio prazos, isso produz custos e confusão. A longo prazo, não há vantagem. Como vou vender livro infantil em Portugal se lá não se usa o gerúndio? O fato de a língua ter uma ortografia única não modifica o mercado em nada, porque o vocabulário continua sendo diferente. Os putos vão continuar a fazer a bicha em Lisboa (em Portugal, a frase significa "os meninos vão continuar fazendo fila"), e aqui não. O governo brasileiro vê vantagens na mudança, em especial na arena diplomática, pois o estabelecimento de uma ortografia única facilitaria a inclusão do português entre as línguas oficiais de órgãos internacionais.

Na semana passada, o ministro da Cultura, Gilberto Gil, disse que o acordo não impedia inovações na língua, e que era importante para "dar um norte".

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