quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

APELO PELAS HUMANIDADES, ainda a manifestações dos professores sobre a resolução SE 97/2007, publicada pelo D.O.E.

Recebemos da professora Carolina o seguinte texto, enviado também para ALESP, SEESP, USP e outras instituições a fim de sensibilização.

"O mundo só pode ir em frente por meio daqueles que se opõem a ele" (Goethe)

A força com que o neoliberalismo lançou seus tentáculos sobre as várias dimensões da vida no fim do século XX resultou, além da consolidação do capitalismo como sistema econômico dominante em escala mundial, na produção de um nefasto efeito sobre os seres humanos: tornou-os homens sem utopias, sem esperanças. A ambição em trilhar pelo caminho “mais rápido e fácil” para atingir-se glória, fama, riqueza e poder; as relações humanas mediadas pela força do dinheiro transformaram homens e mulheres em seres sem sonhos, desinteressados em lutar em prol da justiça social e da correção das desigualdades econômicas e sociais acentuadas pelo “rolo compressor” neoliberal vigente desde fins da década de 1980.

As Humanidades ou Ciências Humanas – as matrizes da História, Geografia, Sociologia e Filosofia - têm conformado o campo de discussão e de revisão crítica acerca dos limites e impasses do sistema capitalista e seus impactos de naturezas diversas sobre a sociedade e o meio ambiente. No entanto, enganam-se os que acreditam que o campo resume-se a esse enfoque: suas contribuições, certamente, vão muito além da percepção da condição humana num sistema naturalmente excludente. Entender-se enquanto sujeito crítico e intelectualmente autônomo, enquanto sujeito histórico que tem funções, direitos e deveres conformados no tempo e no espaço são apenas algumas dos ganhos que as Humanidades trouxeram para a formação de cidadãos conscientes de seu papel na sociedade e no planeta onde vivem.

Em que pese tal contribuição, o governo do Estado de S. Paulo, sob a liderança do PSDB desde meados do decênio de 1990, vem dando sinais claros de que essa formação especificamente humanista de nossos alunos não se alia às expectativas de um situacionismo neoliberal que, ao primar pela consolidação de um Estado mínimo, investe na aculturação das massas por meio da institucionalização de cursos “profissionalizantes de fachada”, posto que serão dados por profissionais não formados em áreas de tecnologia.

A situação que as disciplinas de história, geografia, sociologia, psicologia, filosofia (somam-se a elas também, artes) encontram-se na hierarquia dos saberes escolares revela uma realidade assustadora: a diminuição cada vez mais massiva da grade horária de disciplinas que contribuem diretamente na autonomia intelectual e o pensamento crítico do futuro cidadão brasileiro.

A resolução SE 97/2007, publicada pelo D.O.E. em 21/12/2007, revela contornos de uma pedagogia jacobista que está sendo imposta pela Secretaria da Educação ao professorado paulista que instaurou a lógica da vigilância e punição aos que ousarem “sair da linha” traçada por ela: uma pedagogia que condenou ao ostracismo as disciplinas sociologia e psicologia, ao mesmo tempo de reduz o número de aulas de História, Filosofia, Geografia e Artes. Evidentemente que as disciplinas das áreas de linguagem e exatas são tão importantes quanto as humanidades para a formação de nossos alunos, porém importa fazermos algumas indagações: o que ou a quem o governador pretende atingir com a redução da significação das Humanidades na grade curricular dos ensinos Fundamental II e Médio? Quais valores pretendem “inculcar” nos jovens que estão sendo formados pela mencionada rede? Quais perdas e ganhos representarão tal corte para a formação de nossos cidadãos de amanhã?

As alterações publicadas “no apagar das luzes” e na “calada da noite”, ou seja, quando todo o professorado ingressava em recesso escolar, causou, no mínimo, estranheza e revolta entre a classe do magistério. É inadmissível que tais alterações sejam-nos impostas no início do ano letivo de 2008.

A sociedade, o sindicato e a academia deveriam se mobilizar contra essa situação. Não são apenas empregos e jornadas de trabalho docente que estão em jogo: mas, sobretudo, o investimento na formação de nossos jovens a fim de que se evite ações extremas como as que ocorre no Brasil: índios incendiados, prostitutas e domésticas espancadas, idosos maltratados, negros discriminados.

Hoje, como diria o grande historiador, Marc Bloch, “somos os vencidos provisórios de um destino injusto". Mais do que nunca, hoje, rogo a todos, assim como fez Bertold Brecht à sociedade alemã em tempos de nazismo, o direito de duvidar do que nos está sendo posto como ordinário, natural: “Nós vos pedimos com insistência:

"Nunca digam - Isso é natural,
Diante dos acontecimentos de cada dia,
Numa época em que corre sangue,
Em que o arbitrário tem força de lei, Em que a humanidade se desumaniza,
Não digam nunca:
Isso é natural,
A fim de que nada passe por imutável”.

Em nosso caso, a violência tem outras dimensões, envolve a dignidade do aluno e do professor, colocada em xeque diante da ação de um "Estado consolidado sob a égide da democracia" que demonstra, freqüentemente, sinais de simpatia em relação às práticas ditatoriais.

FONTE: doe 21/12

PESSOAL, NÃO VEJO OUTRA ALTERNATIVA PARA IMPEDIR A AÇÃO DO "ROLO COMPRESSOR": FAZERMOS GREVE JÁ NO INÍCIO DO ANO!

HOJE, FOI GEOGRAFIA E HISTÓRIA. AMANHÃ, SERÃO AS OUTRAS. DAQUI A POUCO, HAVERÁ A PRIVATIZAÇÃO DO ENSINO.


Professora Carolina.

Cartão de Natal de meu amigo Roni

A GUERRA ACABOU

SE ASSIM VOCÊ QUISER

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Nova matriz curricular para 2008 do governo Serra

No final do ano letivo , sorrateiramente ..., ao apagar da luzes , (como a esconder o que deve ser público e transparente, afinal são somente normas e regulações...), a secretaria da educação emite doze páginas de normas e regulamentações para melhorar? , aprimorar? a aprendizagem do alunato, definindo-as e publicando-as no Diário Oficial no último dia letivo!

Qual o interesse do governo em varrer para de baixo do tapete a nova legislação??

Um governo desinteressado de divulgar seus emprendimentos?, existe? Podemos conjecturar... será por que é divulgação obrigatória e gratuita??, não é publicidade paga?? Ou será que, já antecipando reações contrárias o governo quis deixar o pacote autoritário e escaferder-se no lusco-fusco do apagar das luzes...

Seria muito interessante que o Ministério Público procurasse se aprofundar na análise dessa reestruturação , proposta sem discussão , sem audiências públicas , sem debates na Assembléia. Parece que voltamos ao ano que não terminou e, inclusive naquele ano o atual governador, à época saiu às carreiras em busca de asilo político no Chile ...

Propositalmente não faço avaliação dos conteúdos e regras impostas , pois como educador devo , por dever de ofício , ser previdente e cauteloso ao analisar estudos e propostas novidadeiras, e que buscam nos modismos midiáticos se imporem, sem o crivo da Academia ou das pessoas de bom senso.

Segisvaldo Luiz Caldo

sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Segundo a APEOESP: Governo estadual é o responsável pela crise

Em matéria paga publicada hoje no jornal A Folha de São Paulo, a APEOSP responde às críticas sistemáticas da imprensa à categoria.

"Governo estadual é o responsável pela crise na escola pública”


O governo do estado de São Paulo tem orquestrado uma campanha de calúnias contra os professores estaduais com a cooperação de alguns órgãos de imprensa que, ao invés de exercer um jornalismo isento, optam em se aliar aos governantes de plantão.

Com esta ação, o governo tenta responsabilizar os professores pelos péssimos resultados obtidos pelos alunos nas recentes avaliações institucionais. Este quadro é de total responsabilidade de uma administração que há 14 anos adota políticas deliberadas para destruir a escola pública.

O estado mais rico da Federação não possui um Plano Estadual, tampouco assegura investimento adequado para a área que deveria ser prioridade.

Ao contrário, adota ações como a aprovação automática; o fechamento de salas e escolas; superlotação das salas de aula; infra-estrutura inadequada; a municipalização do ensino e a desvalorização dos professores. São Paulo paga um dos piores salários em todo o território nacional, obrigando a categoria a cumprir dupla e até tripla jornada. Além disso, não respeita a database.

Com péssimas condições de trabalho, São Paulo apresenta um déficit de professores habilitados em diversas disciplinas.

As escolas públicas estão abandonadas: mais de 70% não possuem bibliotecas e laboratórios de ciências. Tampouco apresentam instalações adaptadas às necessidades especiais.

Segundo pesquisas elaboradas pela APEOESP/Dieese, 75% dos professores lecionam em salas superlotadas. Vários sofreram algum tipo de agressão e 80% já presenciaram atos de violência. Mais de 40% dos professores são obrigados a exercer outra atividade para complementar o salário. Além disso, 45% da categoria sofre de estresse dignosticado e mais de 25% é acometida pela depressão. O governo não reconhece as doenças profissionais e o atendimento recebido pelos docentes no Departamento de Perícias Médicas é extremamente desrespeitoso. Há dificuldade na concessão de licenças a profissionais com diagnóstico médico de câncer. Um absurdo!

Há anos, a APEOESP denuncia este quadro e apresenta à Secretaria da Educação a pauta de reivindicações, visando melhorar o processo de ensino-aprendizagem, respeitando alunos e professores.

O governo ignora estes dados,aprofunda a desvalorização aos profissionais e criminaliza, com o auxílio de alguns órgãos de imprensa, os representantes da categoria.

Para acentuar ainda mais esta desvalorização,os professores correm o risco de perder a sua liberdade de cátedra, pois seus projetos pedagógicos e seu acúmulo de conhecimento podem ser substituídos por sistemas apostilados elaborados pelas grandes corporações de ensino privado, como já ocorre em vários municípios, acarretando a perda da autonomia das escolas.

Estas medidas fazem parte de um projeto que visa oferecer um ensino de péssima qualidade aos filhos da classe trabalhadora. As recentes alterações na matriz curricular com a exclusão e a redução da carga horária de importantes disciplinas confirmam o descomprometimento da administração com a formação universal dos alunos.

Nós, professores estaduais, não vamos nos abater por esta sórdida campanha que visa responsabilizar-nos pela crise resultante de um projeto falido.

Convocamos a população e as demais entidades da sociedade civil, realmente comprometidascom os interesses populares, a lutarem conosco contra a política educacional do governo estadual. Vamos ampliar a luta em defesa de um ensino de qualidade aos filhos da classe trabalhadora com valorização aos profissionais, através de um Plano de Carreira que instigue o professor a permanecer na sala de aula; mais investimentos; instituição de um Plano Estadual de Educação; pelo fim da superlotação das salas de aulas, garantindo acompanhamento individualizado a cada aluno; dentre outros pontos que reivindicamos.

Educação pública de qualidade é um direito inalienável da população. Não podemos permitir que usurpem este direito!

MATÉRIA PAGA PELA APEOESP, PUBLICADA NA FOLHA DE SÃO PAULO DE 21/12/2007 PAG. C7.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Sistema de Ensino?

O artigo da Educação omite dois fatos importantes relativos ao tema: o pioneirismo do Sistema UNO (Grupo Santillana, do qual também faz parte a Editora Moderna) e o ingresso da Editora Saraiva no mercado de sistemas de ensino com a recente aquisição do Sistema Ético (Editora Pigmento).

Omite também algo que a nosso ver é crucial: a autonomia do professor em relação a esses materiais. Um sistema de ensino de modo geral é comprado como um produto fechado, apostilas para todas as disciplinas (nem sempre com qualidade em todas as disciplinas); condução de um dado projeto pedagógico; treinamento (que é bastante diferente de formação). De modo geral, esses contratos com as escolas as 'prendem' durante um longo tempo, sem possibilidade de trocar o material, caso ele não seja bom para a escola, seus professores e alunos...


REVISTA EDUCAÇÃO Edição 128, dezembro de 2007.

Uma disputa acirrada


Com a entrada em cena do Ser (Grupo Abril) e da FTD, aumenta a oferta dos chamados "sistemas de ensino" e a briga por alunos de escolas públicas e privadas

Rubem Barros, colaborou Ricardo Marques

Em artigo escrito para a revista Educação e Sociedade de dezembro de 1999, Dermeval Saviani, professor emérito da Unicamp e coordenador do grupo de estudos "História, Sociedade e Educação no Brasil", definia, com rigor acadêmico, o significado original da expressão "sistema de ensino".

No dizer de Saviani, sistema de ensino é "uma ordenação articulada de vários elementos necessários à consecução dos objetivos educacionais preconizados para a população à qual se destina". Explica, ainda, que a ação sistêmica está necessariamente vinculada a um plano de ação que dê coerência a um conjunto de finalidades, com atividades organizadas segundo normas que decorrem de valores. E alerta para usos mais genéricos da expressão, que levariam a imprecisões conceituais.

Nesse artigo, intitulado "Sistemas de ensino e planos de educação: o âmbito dos municípios", o autor discutia questões decorrentes das transformações tanto da Constituição Federal como da Lei de Diretrizes e Bases, então recém-vigentes. E questionava até que ponto os municípios estariam, do ponto de vista legal, aptos a constituir sistemas de ensino próprios e fazer seus planos educacionais.

Oito anos depois, o processo de municipalização das redes de ensino já se tornou realidade em muitas cidades brasileiras. Boa parte delas, ao fazer essa migração, se viu órfã das matrizes diretivas e dos valores educacionais que definiam suas práticas, antes gestadas no âmbito dos estados. Muitas delas optaram por contratar o serviço de terceiros que provêem o material didático, planos de aula, avaliações institucionais e a formação contínua dos professores, entre outros serviços.


Ainda que de certo modo sejam assistêmicos, pois não congregam a dimensão integral explicitada por Saviani, esses serviços, criados ainda antes da LDB no âmbito das escolas privadas, foram batizados de "sistemas de ensino". E estão, cada vez mais, caminhando para atingir um estado de quase ubiqüidade na educação brasileira.

Como se diz no jargão dos economistas, trata-se de um mercado superaquecido. Prova disso é a recente entrada em cena de dois novos concorrentes: o grupo Abril, que promete investir R$ 10 milhões nos próximos três anos, com a expectativa de abocanhar 20% do mercado, e a editora FTD, peso-pesado no campo do livro didático. Além deles, há também a Rede Católica de Ensino, há um ano no mercado e voltada exclusivamente a esse segmento, e novidades como o Programa Cidade Educadora, que se auto-intitula como "transdidático", e o Sistema Criar de Ensino da Língua Portuguesa, novas variantes que buscam emplacar serviços para determinados nichos de mercado.

Segundo Emerson Santos, diretor de marketing da Abril Educação, de maio, mês em que o Ser foi efetivamente lançado, até o início de outubro, atingiu 20% de sua meta. Números de contratos fechados, no entanto, são um mistério. Como muitas das empresas do segmento, a Abril diz que não os menciona.

Também da mesma forma que executivos de outras empresas, Santos faz questão de ressaltar o papel do professor em relação ao sistema de ensino. "Quem executa o processo é a escola, nós entramos apenas como um facilitador desse processo. O grande papel está na mão do professor, e é preciso que ele tenha ferramentas e condições para desenvolver o processo de aprendizado com os alunos", defende. E completa: "O que queremos é juntar tudo que a Abril Educação tem de melhor, em termos de conteúdo, juntando aí os grandes autores, as publicações, juntar a um pacote de serviços que também desenvolvemos e oferecer às escolas".

Para Santos, o fato de a Abril ter no grupo as editoras Ática e Scipione, tradicionais no segmento do livro didático, é um fator-chave para o sucesso do Ser. As publicações do sistema serão produzidas por autores das duas editoras. Segundo o executivo, foram selecionados alguns deles, mais afinados com a linha metodológica adotada.

Uma das metas educacionais prioritárias do sistema é fazer com que o estudante passe no vestibular. "Também temos a preocupação de oferecer outras reflexões, mas o vestibular é um item básico no sistema de ensino, não dá para se iludir. Temos de estar focados nisso", assume Santos. Num primeiro momento, o sistema, que convive também com o Apoioescola, lançado pela Abril no ano passado, está mais voltado a escolas privadas. Mas, em breve, o Grupo também irá buscar se inserir nas redes públicas.

Para a maioria dos concorrentes, ao menos no discurso a entrada do Grupo Abril fará bem ao mercado. Para Maria Cristina Swiatovski, diretora-geral da Opet - que atua em 300 escolas de todo o Brasil, com cerca de 75 mil alunos - ,um dos principais benefícios da entrada do concorrente é fortalecer o próprio conceito de sistema de ensino.

"Isso nos provoca a melhorar, pois tudo que a Abril faz, faz com qualidade", diz. Mas ressalva que a operação da concorrente não tem um trunfo que muitos dos outros sistemas podem apresentar: o fato de terem escolas próprias. "A escola funciona como um laboratório que retroalimenta o sistema. Fazemos constantemente avaliações, do aprendizado dos alunos à gestão, passando pela motivação dos professores. Se algo não vai bem, acende-se uma luz que nos leva a melhorar o material ou o trabalho de assessoria", explica Maria Cristina.

Márcia Carvalhinha, coordenadora do apoio pedagógico de convênios do Objetivo (750 escolas, sendo 200 públicas, e cerca de 476 mil alunos), vai na mesma linha. Elogia a seriedade e a qualidade da Abril, mas diz que o diferencial de sua instituição é ser uma rede de escolas. "O que oferecemos aos nossos parceiros é um pacote de produtos e serviços testado em nossas salas de aula. Quem escreve o nosso material didático são os professores que estão em sala de aula, testando-o com o aluno."


Quem, ao menos oficialmente, não está incomodado com a entrada em cena da Abril é o Grupo Positivo, do Paraná, maior empresa do segmento. À pergunta sobre se há alterações no trabalho da Editora Positivo em função dos novos concorrentes, Hélcio Rodrigues Simões, gerente de marketing da divisão de sistemas de ensino responde com um lacônico "não". Atualmente, segundo o dirigente, o grupo conta com 2.900 escolas e 650 mil alunos, aí computados seus dois sistemas de ensino, o SPE e SABE, voltados às redes particular e pública, respectivamente.

Migração

A constituição do Sistema Ser expõe mais claramente um movimento de mercado, que vai ganhando peso à medida que muitas redes públicas de ensino, especialmente as de prefeituras de porte pequeno, começaram a recorrer aos sistemas como forma de dar unidade e orientação a seu corpo docente. Isso porque, ao passarem do Estado para a prefeitura, muitas escolas ficaram sem orientação pedagógica e formação continuada de professores, entre outras articulações que os corpos diretivos estaduais proporcionavam.

Assim, muitas editoras de livros didáticos e paradidáticos se viram perdendo expressivas fatias de mercado para o material preparado pelos sistemas, pois estes, além do material, oferecem apoio ao professor.

Foi o que aconteceu com as duas do grupo Abril, Ática e Scipione, e também com a FTD, outra que também passará a atuar, a partir de 2008, nas duas frentes. A decisão de criar o FTD Sistema de Ensino foi, segundo Silmara Vespasiano, gerente editorial do grupo, "apontada pelo mercado". "Ouvimos nossos representantes e filiais, pesquisamos a análise de adoção dos nossos livros e o que estava acontecendo", diz.

Segundo Silmara, há três anos a FTD lançou um material de revisão para o 3º ano do ensino médio, com a idéia de oferecê-lo como complemento às atividades pedagógicas de classe. Mas muitas escolas começaram a requisitar o material para ser usado em sala de aula. "Vimos que tinha aceitação, e começamos a pensar em ter o nosso próprio sistema de ensino", conta a gerente. A editora decidiu, então, instituir o material para o 1º e 2º anos do ensino médio e para o 1º a 5º anos do fundamental. A meta inicial para a área pedagógica é ter mais de 200 escolas conveniadas até 2009.

Além dos serviços agregados que integram o pacote - suporte pedagógico, atendimento on-line via site, serviço 0800, atividades didáticas, avaliações, simulados e desafios para os alunos do ensino médio, atividades diversas para os alunos do ensino fundamental, assessoria pedagógica presencial e treinamento, ambos sob solicitação da escola -, o di­ferencial apontado pela FTD são seus autores. "A maioria dos sistemas apostilados tem uma grande coordenação, mas não tem os autores de didáticos. Temos esses autores e, no caso do fundamental, com grande vivência de sala de aula", destaca Silmara.

A editora adaptou os livros para as apostilas. "Mantivemos a distribuição do conteúdo e a qualidade gráfica do livro", diz a gerente, que julga necessário que os materiais apostilados passem por um processo de análise semelhante ao que é feito com os livros no Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), rea­lizado em conjunto por universidades e pelo Ministério da Educação. "Se passamos por esse crivo, por que os sistemas não passam? Por que algumas escolas vão utilizar material que foi analisado e outras não?", pergunta Silmara.

Outro novo concorrente do setor é a Rede Católica de Educação (RCE), sistema em operação há um ano e voltado exclusivamente às escolas católicas. Segundo Manoel Alves, presidente da organização, trata-se de um serviço que visa fortalecer o segmento.


"Havia muitas católicas que estavam em outros sistemas de ensino, sobretudo porque não tinham um sistema próprio à disposição. E outras escolas religiosas que precisavam de um sistema, sem que houvesse uma opção com esse ideário", avalia Alves.

O pacote de serviços - ou soluções integradas - oferecido pela RCE tem pontos de identidade com os competidores (capacitação de gestores, equipes técnicas e professores, portal de internet, avaliação e livros didáticos, entre outros) e outros característicos de entidades dessa natureza, tais como aconselhamento para questões sociais, pastoral da juventude e catequese sacramental.

Para Alves, seu diferencial é a oferta de tradição e inovação conjugadas. A tradição vem do ideário católico, e a inovação de "uma concepção pedagógica mais atualizada". Segundo o dirigente, se apenas as escolas católicas que já estão conveniadas a outros sistemas migrarem para a RCE, em três anos ela estará entre as três maiores redes. "Depois de um ano, já somos maiores do que a maioria", sustenta ele.


Cidadania e português, alternativas

Um livro para quem não quer livro. Segundo Áureo Gomes Monteiro Jr., sócio-proprietário da Editora Aymará, essa foi a idéia de partida da Coleção Cidade Educadora, lançada em novembro depois de passar por um tempo de "vivência" em escolas de Esteio (RS), no ano de 2006.

"Imaginamos fazer um livro transdidático, para ser usado em conjunto com os recursos didáticos que a escola já tem. Não é um conteúdo curricular tradicional e permite que professor e aluno utilizem uma competência que valorizamos muito, que é a linguagem", diz Monteiro Jr., que trabalhou no Positivo durante quase 10 anos.

Em essência, a idéia é que o material trabalhe os chamados temas transversais por meio de textos literários, com forte ênfase em questões ligadas a valores e cidadania. Dessa forma, a coleção não se coloca como concorrente nem do livro didático e nem dos apostilados. Traz, além disso, serviços como formação de professores, planejamento estratégico, identificação de potencialidades, avaliação de recursos humanos e de estrutura, uso de tecnologia educacional e avaliação e monitoramento.

Já o Sistema de Ensino de Língua Portuguesa Criar, sediado em Ribeirão Preto (SP), usa a mesma nomenclatura, mas funciona como uma escola de línguas, com a peculiaridade de que o idioma oferecido é o português.

Com três focos de atuação - alunos que estão se preparando para o vestibular; universitários que estão fazendo monografias e outros trabalhos acadêmicos; e pessoas do meio corporativo que precisam melhorar a redação -, o Criar tem aproveitado a grande demanda pelo aprimoramento da escrita que existe hoje, em grande parte decorrente da ineficiência da escola. Além de quatro unidades próprias, todas na região de Ribeirão Preto, o sistema já tem franquias em outras 11 cidades do interior, nove do Estado de São Paulo, uma do Rio de Janeiro e uma de Minas Gerais.

domingo, 16 de dezembro de 2007

Tião Rocha no Roda Viva e as lições do educador popular


Tião Rocha Educador


Aumentou a proporção de estudantes brasileiros nas últimas décadas. Em 1940 apenas 31% das crianças estavam matriculadas, enquanto em 2000, 95% freqüentavam salas de aula. Mas o maior desafio segue sendo o de ter uma educação de qualidade.

No último levantamento realizado pelo PISA - Programa Internacional de Avaliação de Alunos, o Brasil está em 54º lugar na classificação geral que avaliou o desemprenho de estudantes de 15 anos em matemática, ciências e leitura, entre alunos de 57 países.

O entrevistado do Roda Viva desta segunda-feira diz que as escolas precisam ser tão boas que alunos e professores queiram freqüentá-la também aos sábados, domingos e feriados.

Tião Rocha critica a escola formal e diz que ela precisa de mais ousadia e experimentação. Ele criou no sertão de Minas Gerais um projeto pedagógico que mescla educação, cultura e ação social. Utiliza uma maneira de ensinar e aprender baseado no saber popular, no lúdico e no afeto.


Entrevistadores: Júlio Moreno, diretor de jornalismo da TV Cultura; Fernando Rossetti, jornalista especializado em educação e Secretário Geral do Gife (Grupo de Institutos Fundações e Empresas); Uirá Machado, coordenador de artigos e eventos do jornal Folha de S. Paulo; Gilberto Nascimento, oficial de comunicação do Unicef; Mozart Neves Ramos, presidente executivo do Movimento Todos Pela Educação; Renata Cafardo, reporter de educação do jornal O Estado de S. Paulo.

Apresentação: Paulo Markun

(Extraído: do Site Roda Viva 10/12/2007) Comentários da Platéia



Sobre educação, rodas, sabão e brinquedos


Entrevistado no programa Roda Viva, educador Tião Rocha fala sobres duas idéias e projetos
Por Elisa Marconi e Francisco Bicudo
Na segunda feira, dia 10 de dezembro, o entrevistado do programa Roda Viva, da TV Cultura de São Paulo, foi o educador mineiro Tião Rocha. Fundador da ONG Centro Popular de Cultura e Desenvolvimento (CPCD), sediada em Belo Horizonte (MG), Rocha acaba de receber o prêmio “Empreendedor Social”, oferecido pelo jornal Folha de S. Paulo e pela Fundação Schwab, da Suíça. A conquista aponta para o reconhecimento dos métodos educacionais nada ortodoxos, mas bem divertidos, desenvolvidos pelo CPCD, que atende meninos e meninas com dificuldades escolares ou que vivem em situação de risco.
Para compreender com mais detalhes o trabalho da entidade, é necessário conhecer a trajetória de Tião Rocha. Formado em História e Antropologia, no início da década de 1980 ele começou a lecionar na Universidade Federal de Ouro Preto. Passados poucos anos, os problemas com a instituição começaram a se manifestar de forma mais intensa. O educador diz ter percebido que não seria ali, intra-muros e no ambiente acadêmico, que poderia realizar seu desejo de educar meninos e meninas. Em 1982, decidiu pedir demissão e se desligar da universidade, fundando em 1984 o CPCD. A idéia era, já ali, relacionar a educação a algo tão lúdico e agradável como brincadeiras, jogos e conversas com amigos. A proposta era também ajudar meninos e meninas a construir auto-estima sólida para que se transformassem em sujeitos de suas vidas e de seus processos. A educação idealizada por ele se daria, a partir de então, embaixo de um pé de manga, como ele mesmo gosta de dizer.
E o lugar não foi escolhido por acaso. Remete à cultura do interior de Minas Gerais, nascedouro e colo acolhedor das idéias heterodoxas dos educadores do CPCD. Ali, entre o sertão e o mar, a sombra da mangueira é um ponto de encontro tradicional, onde decisões são tomadas e planos são traçados. Esse cuidado, respeito e incentivo às tradições locais representam a condição primeira para concretizar as propostas educacionais do CPCD. “Quando se valoriza a cultura local, do lugar de origem de cada um, se respeita o pertencimento dos meninos e meninas e isso é acolher, valorizar”, disse o antropólogo e historiador, durante a entrevista. Na outra ponta, nas escolas formais, o que se vê, segundo ele, é uma grande indiferença à história e às heranças das pessoas. “História, por exemplo. Você só aprende a do outro se conhece a sua própria história. Perdemos anos estudando Luis XV, os Bourbon, os reis de Roma, mas não dedicamos um dia sequer ao congado, às vaquejadas, à malhação de Judas”. Por isso a proposta primeira da ONG é respeitar as tradições locais.
Pedagogia da rodaE foi então sob o pé de manga que Tião Rocha reuniu pessoas que se ofereceram para ajudar a resolver os dilemas da educação da cidade de Curvelo – e é justamente nesse momento que se revela o primeiro pilar da pedagogia desenvolvida pelo CPCD. “Numa roda todo mundo se vê. A roda é lugar de debate de idéias e de consenso. Não tem eleição, tem discussão e consenso. Todo mundo se vendo e propondo. Essa é a pedagogia da roda”, afirmou ao Roda Viva. É impossível não pensar na inércia que muitas vezes marca as salas de aula convencionais. “Nesse espaço, os meninos ficam olhando para a nuca uns dos outros, não há um convite para o debate, para o embate democrático e pacífico das idéias”, completou. Não significa que a disposição física dos presentes seja a única razão pelos fracassos sucessivos da escolarização no Brasil, mas Tião garante que em tópicos aparentemente irrelevantes como esse é que moram adormecidas as grandes mudanças.
O segundo pilar da organização é o que o educador chama de a pedagogia do sabão. “Essa pedagogia diz respeito à tomada de iniciativa por parte da comunidade para resolver os problemas da educação de suas crianças e da própria comunidade”, pontuou. Novamente ele resgata a herança ancestral brasileira, aqui representada no engenho de fazer sabão, para materializar uma proposta verdadeira de empreendedorismo. Numa roda, os moradores da comunidade chegam a um acordo sobre o que é necessário para melhorar a vida e a educação ali e recebem apoio para tocar os projetos adiante.
Foi assim por exemplo que nasceu o Projeto Fabriquetas, conhecido em seu nome técnico como Núcleos de Produção de Tecnologias Populares. As mini-empresas formadas atualmente já estão presentes em Curvelo, São Francisco e Araçuaí. Trocando em miúdos, essas fábricas se apropriam de tecnologias populares de baixo custo e aplicam tais técnicas na produção de artefatos, que são então vendidos pela Cooperativa Dedo de Gente, que reúne esses núcleos desde 1996. Tião Rocha, no entanto, gosta de dizer que não se trata apenas de economia. Há dois pontos importantes nessa área das fabriquetas. Primeiro, a riqueza do processo e a possibilidade de ver essa gente se associando e criando instrumentos de organização coletiva e auto-gestão, que garantem a autonomia das unidades. O segundo tópico é a questão do coletivo. Para se tornar membro da cooperativa, é preciso fazer parte de uma Fabriqueta. E isso revela também outro preceito do CPCD: "educação é algo que só ocorre no plural", assegurou Tião, diante dos entrevistados.
Pedagogia do brinquedoAté aqui, tem-se a concepção de uma educação que precisa estar baseada e respeitar a localidade, que se alicerça na pedagogia da roda – onde todos têm o mesmo espaço democrático e discutem até chegar num consenso – e na pedagogia do sabão – com a qual se aprende que somando esforços da comunidade e se calcando nas tecnologias populares é possível gerar trabalho, renda e soluções para as comunidades. Faltava fazer de tudo isso uma brincadeira, dar um ar de molecagem na rua, de jogo com os colegas. E é justamente daí que nasce o terceiro pilar: a pedagogia do brinquedo. Foi por meio dela que o CPCD desenvolveu quase 170 jogos que hoje alfabetizam, ensinam a contar e a escrever – entre tantas outras possibilidades – meninos e meninas dentro e fora da escola.
Como tudo é amarradinho, os jogos são fabricados e vendidos pelas fabriquetas. Os jogos atualmente são vistos como tecnologia educacional e utilizados em vários colégios de Minas Gerais, de outros estados e até de fora do país. Os brinquedos criados por Tião e sua equipe já chegaram, por exemplo, a Moçambique e a Guiné Bissau, na África, e representam a ponte mais concreta de intercâmbio entre a ONG e as escolas.
Na entidade criada por Tião Rocha, atuam 30 funcionários e quase 500 educadores. Ela já foi capaz de atender cerca de 20 mil crianças desde sua fundação. E, embora os críticos apontem que essa empreitada toda só dá certo porque foi implantada em cidades pequenas, ele conta que Santo André, no grande ABC Paulista, uma cidade bem urbanizada, vizinha a São Paulo, já adota algumas metodologias desenvolvidas pela instituição. “O que mostra que não é preciso ter um pé de manga de verdade. Há tantos lugares ociosos, parques, praças, garagens, lugares para olhar, trocar e aprender. Qualquer lugar pode ser um lugar de educação”, explicou. A única ressalva dele é para a qualidade do educador. Sem escola se faz educação, mas sem educadores não, ele repete sempre.
Tião Rocha não tem medo de, ao dizer o que pensa, ofender as escolas tradicionais. Durante o Roda Viva, Renata Cafardo, repórter de Educação de O Estado de S. Paulo, perguntou o que o educador achava dos resultados brasileiros em rankings como o PISA, um programa internacional de avaliação comparada de alunos na faixa dos 15 anos que revelou no início de dezembro que o Brasil ocupa a 54ª posição, entre os 57 países avaliados. Em sua resposta, Tião primeiro reforçou a diferença entre educação e escolarização e aproveitou para criticar as escolas formais: “embora vendam educação, na verdade, as escolas estão especializadas em passar conteúdo, escolarizar. Por isso os dados do PISA não são novidade. Todo mundo sabe que lugar ocupamos”, respondeu.
Então a escola formal seria algo inviável? Tião garante que não. Para ele, não só as escolas são fundamentais, como também nelas pode estar contida a semente da mudança. O especialista chama a atenção para realidades mais que relevantes – e a relação de ensino e aprendizagem é o primeiro de seus alvos. O educador destaca que esse binômio deveria ser equilibrado, mas normalmente não é. A disposição física é prova disso. E a maneira como encaramos a relação professor-aluno seria um outro indicador importante dessa vertente: um sabe tudo, e o outro é uma mente vazia a ser trabalhada. “A escola não usa nem 10% de suas capacidades. Ela escolhe um jeito único, uma fôrma para enquadrar e os meninos que se encaixem”, observou. A sugestão dele é que, para sair da Idade Média, a escola só tem duas alternativas: ousar e criar. No sonho de Tião Rocha mora uma escola tão gostosa e tão bem construída que alunos, professores e comunidade teriam vontade de ir lá todos os dias, inclusive aos finais de semana.
Ótica mercadológicaPara o fundador do CPCD, o triste porém é que a escola se rendeu a uma ótica capitalista, mercadológica, que forma pequenas engrenagens para uma máquina imutável. “A escola tem esquecido sua função social que seria de educar e escolarizar crianças; de tão excludente, acaba nem conseguindo cumprir essa proposta original de formar operários. Dali não saem nem os profissionais do mercado e nem as pessoas bem educadas”. Por outro lado, o antropólogo admite que sozinha a escola não conseguirá promover essa revolução que a educação precisa. “Em Moçambique, eu aprendi que é preciso uma aldeia toda para educar uma criança. Aqui não é diferente. A escola sozinha não consegue fazer essa transformação, é preciso convocar a aldeia. Os pais, a comunidade, os professores”, completou.
Aliás, ele sugere que essa mudança de postura comece com os professores, que têm – segundo Tião – o privilégio de ter 180 dias por ano de contato direto com seu aluno e 180 dias por ano para passar o mundo a limpo. E para motivar esse professor a encarar a educação de uma outra maneira, a escola tem de se abrir para aprender, para ouvir seus alunos, os pais, a comunidade e os professores. Também os cursos de formação de educadores precisam formar mais que repetidores de conteúdos. Devem preocupar-se com a qualificação de gente curiosa, com vontade de aprender permanentemente.
Gente educadaLá no CPCD, o educador acredita que os dias de contato com as crianças são bem aproveitados e que de fato elas – ao passarem por ali – se tornam gente educada, como ele gosta de dizer. No entanto, a maneira como se avalia os meninos e meninas que passam por ali ainda gera dúvidas e uma certa desconfiança. Entre os entrevistadores do Roda Viva, a questão sobre como se mede o que as crianças do CPCD aprenderam efetivamente foi levantada várias vezes. Tião Rocha concorda que não há uma régua que meça a auto-estima, por exemplo, mas com seu jeito mineirinho vai explicando o processo pelo qual educadores e crianças passam para concluir uma avaliação. Primeiro eles partem da premissa que as pessoas estão no mundo para (1) serem livres, (2) serem educadas, (3) serem felizes, e (4) terem saúde.
Os processos todos devem apontar para esses objetivos. Uma educação que olhe para essa condição não pode ser, portanto, uma mera habilitação técnica. Ela tem que formar um cidadão solidário, com auto-estima bem construída, que consiga estabelecer contato com a comunidade. E como se mede se o menino conseguiu isso? “Aí entra a arte do educador, é a percepção que ajuda nisso é o olhar para os pequenos detalhes, para uma postura, para uma maneira diferenciada de resolver os problemas”, explicou.
Mas já que os entrevistadores insistiam nos parâmetros, Tião contou que eles observam se a criança está rindo, está limpa, tem atitudes solidárias, participa da roda e cuida das suas coisas. Esses cinco parâmetros ajudam a revelar se o menino está bem integralmente ou não. Se ele chora mais que ri, ou se anda sujo, ou se não cuida bem das suas coisas e dos objetos do grupo, ele não estaria bem – e para essa criança seria necessário então um olhar mais atento. “É uma linguagem de códigos, que a matemática não consegue quantificar, mas que um olhar preparado consegue”. E se a criança não vai bem? “Ai aplicamos o cafuné pedagógico”, contou o educador, entre risos. Segundo ele, esse cafuné consiste em observar a maneira como ele vai se apropriando do aprendizado, como vai experimentando sua criatividade e como vai transformando a pedagogia do CPCD. “São todos indicadores da qualidade da educação e isso dá para medir”, afirmou.
Encerrando a participação no programa, Tião Rocha contou que outro trabalho do CPCD é acompanhar e monitorar a vida dos meninos e meninas que passaram por lá. “Eles vão bem, muito bem. São todos pessoas de bem, em dia com sua auto-estima, capazes de buscar sua sobrevivência de forma ética, solidária e comprometida com a comunidade. Enfim, são todos gente educada”, concluiu.

Extraído de Boletim do SIMPRO- Edição nº 185 - 14/12/2007

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Editora Moderna se manifesta sobre acusação de fraude no PNLD 2008

Diante do parecer da auditoria realizada pelo Ministério da Educação, que livra a Editora Moderna de qualquer culpa, a editora publicou nota oficial sobre o tema:

Moderna reitera confiança no PNLD

A Editora Moderna reitera a confiança que sempre depositou na excelência do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), confirmada pelos resultados do processo de auditoria no sistema de escolha de livros didáticos para o ensino fundamental e médio, conduzido pelo Ministério da Educação e sob o acompanhamento da Controladoria-Geral da União (CGU).

A apuração das questões, apresentadas pela Associação Brasileira de Editores de Livros (Abrelivros) em 20 de novembro, concluiu pela inexistência de fraude ou favorecimento a qualquer editora participante do PNLD, reafirmando a lisura dos procedimentos e o profissionalismo do programa.

Tranqüila em relação a seus procedimentos comerciais e editoriais, a Moderna coloca-se, como sempre esteve, à disposição das autoridades de ensino para colaborar com o aprimoramento constante do PNLD e reafirma seu compromisso de contribuir permanentemente com o desenvolvimento da educação no País.

Esse compromisso tem levado a Editora Moderna a trabalhar no desenvolvimento de coleções de livros didáticos para todas as matérias do ensino básico. Como fruto dessa política, a editora vem galgando posições de liderança no mercado de livros didáticos, tanto no segmento de escolas privadas quanto no de ensino público.

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

O professor não é coitado; coitadas, são as estatísticas

MÍDIA & EDUCAÇÃO
O professor não é coitado; coitadas, são as estatísticas

Por Gabriel Perissé em 10/12/2007

Na edição 2038 da revista Veja, o economista Gustavo Ioschpe escreve artigo com intuito polêmico. O título antecipa a conclusão de Gustavo: o professor não é um coitado. A sua argumentação, baseada na "frieza dos dados", procura desmistificar esse nosso professor-herói, que heroísmos precisaria fazer se enfrentasse – Ioschpe provará que isso tudo é ilusão – graves dificuldades e problemas no seu dia-a-dia profissional.

O texto merece ser lido com realismo, ou passaremos a pensar que a imprensa brasileira, nos últimos vinte anos, movida pelo mais baixo sensacionalismo, trouxe à luz algumas exceções terríveis (um ou outro caso de violência nas escolas, um ou outro caso de salas superlotadas), exceções apenas, pois a verdadeira situação educacional seria outra. Situação, de acordo com o economista, até favorável...

O que realmente atrapalha, segundo o articulista, são as reivindicações do professorado. Reivindicar a recuperação da dignidade do magistério e melhores condições de trabalho, entre outras providências, seria uma desculpa para adiar a discussão que interessa: os modos concretos de elevar a qualidade da educação.

Primeiro indício: o fato de muitas pessoas quererem atuar no magistério. O magistério no Brasil seria uma profissão tão ou mais almejada do que Direito, por exemplo. A última Sinopse Estatística do Ensino Superior (2005) revelava a existência de 904.000 alunos matriculados em cursos da área de educação, ou o equivalente a 20% do total de alunos do país. Área de estudo tão popular (somos hoje cerca de três milhões de professores) daria a entender que se trata de carreira promissora.

"Masoquistas" e "desinformados"

As estatísticas, os números – todos sabemos que estatística é como biquíni, parece mostrar tudo, mas esconde o essencial – não justificam que o articulista pergunte, ironicamente, se tantas pessoas optam pela carreira por serem masoquistas ou desinformadas.

Algumas ponderações são oportunas:

1. Muitos advogados, e outros profissionais liberais, além de atuarem em suas carreiras de origem, tornam-se professores no ensino superior, compondo aquela cifra de três milhões. Para eles, atuar no magistério não é o ganha-pão. Não são masoquistas ou desinformados. E também não fizeram curso de pedagogia...

2. Também não se formaram em pedagogia os chamados "professores leigos", que lecionam para alunos das primeiras séries do ensino fundamental. Representam algo em torno de 10% do total de docentes (300 mil heróis...), mas não concluíram ou sequer cursaram o ensino médio. Vivem sobretudo nas localidades mais carentes. Não são masoquistas ou desinformados. São brasileiros fazendo o que podem.

3. Dentre os alunos que ingressam em cursos da área de educação, a imensa maioria é do sexo feminino (92,4%, segundo o INEP, em pesquisa publicada em 2002). Essas professoras, na maior parte das vezes, atuam no ensino fundamental. A feminização do magistério tem sido muito estudada, mas o que podemos dizer, no contexto desta discussão, é que os homens, em busca de melhores salários, voltam-se para outras profissões, sim. O salário da esposa professora contribui para a renda familiar, sem dúvida, somando-se ao salário do marido. As mulheres não são masoquistas ou desinformadas por optarem pela profissão docente. Querem ser professoras porque querem ser professoras.

4. Por outro lado, faltam professores no Brasil. Por que o articulista não trouxe esse dado igualmente "frio"? Hoje, só no ensino médio, temos um déficit de 250 mil professores. (Não parece que faltem advogados no mercado...) Estudo da Unesco situa o Brasil entre as nações com a pior relação professor-aluno no ensino básico.

Noites são tempo de trabalho

Para Gustavo Ioschpe, muitos querem ser professores porque, no fundo, conhecem a verdade que a mídia oculta: o magistério não está tão desvalorizado assim, e não é trabalho tão trabalhoso.

Segundo a Unesco, 58,5% trabalham em uma única escola; 32,2% fazem dupla jornada; 9,3% trabalham em três escolas ou mais. Carga horária: 31% trabalham entre 1 e 20 horas em sala de aula por semana; 54% ficam entre 21 e 40 horas; 15% trabalham mais de 40 horas semanais. Com relação ao trabalho que os professores realizam fora da sala de aula (correção de tarefas, preparação de aulas etc.), Gustavo argumenta que todos os outros profissionais liberais enfrentam essa realidade: "Qual o médico que não estuda fora do consultório ou o advogado que não pesquisa a legislação nos horários fora do escritório?"

De novo, vale a pena colocar em dúvida as certezas do articulista. Que provavelmente desconhece a realidade concreta do professor, e por isso se apega aos números "frios", longe do cotidiano escolar.

Um professor que trabalhe 30 horas em sala de aula por semana, expõe-se seis horas por dia a um número variado de alunos. Digamos que esse professor trabalhe em duas escolas diferentes, de ensino médio, para um total de oito classes, cada classe com cerca de 35 alunos. Ao longo dos meses, acompanhará 280 adolescentes. São 280 pessoas com qualidades e circunstâncias que, em tese, o professor deve conhecer para que o processo educacional corra bem. São 280 adolescentes que precisam ser motivados, acompanhados, avaliados. Quem leva a sério essa tarefa (planejamento, aulas interessantes, avaliação justa etc.) sabe que as noites, os sábados e os domingos tornam-se tempo de trabalho, excedendo em muito aquelas 30 horas semanais.

Mudanças positivas

O número de professores estressados e com problemas de voz é significativo. As causas desses transtornos estão no "clima" da sala de aula, em escolas públicas ou privadas, no ensino fundamental ou superior. A Unesco (2002), ao pesquisar o perfil do professor brasileiro, detectou que 54,8% têm dificuldades para manter a disciplina em sala de aula; 51,9% enfrentam diferentes problemas por causa das características sociais dos alunos; e 44,8% consideram difícil a relação com os pais dos alunos, em não poucos casos porque esses pais estão ausentes!

Para citar estudo recente, a pesquisadora Gisele Levy (UERJ) divulgou um resultado preocupante, que reflete a realidade de muitas cidades brasileiras: cerca de 70% dos professores de cinco escolas públicas em Niterói sofrem da chamada síndrome de Burnout, que se traduz em exaustão emocional, despersonalização e falta de realização.

Outro mito seria imaginar as escolas brasileiras sem condições mínimas de infra-estrutura. Escolas de lona ou de lata seriam casos raros, aberrações. "Mais de 90% de nossas escolas de ensino fundamental têm banheiro, água encanada e esgoto, e 87% contam com eletricidade. Quase um terço tem quadra esportiva, e 42% dispõem de computadores."

De fato, com FHC e Lula houve mudanças positivas, como demonstra o

trabalho A infra-estrutura das escolas brasileiras de ensino fundamental: um estudo com base nos censos escolares de 1997 a 2005, de autoria de Sergei Soares e Natália Sátyro (Ipea).

Violência nas escolas

Até 1997, porém, 41% das nossas escolas não tinham acesso à energia, 13% não tinham água, 43% careciam de biblioteca ou sala de leitura, 63% não dispunham de computadores. E as "escolas de lata" existiram (terão desaparecido mesmo?) e foram até defendidas, em 2005, pela Secretaria de Educação de São Paulo, em plena gestão Alckmin: "Têm bom isolamento térmico, ventilação e iluminação basicamente idênticas às das escolas de alvenaria..."

Por outro lado, os resultados referentes à aprendizagem continuam estáveis ou em queda. As melhorias materiais ajudam, tornam a escola um lugar digno, mas sozinhas, pouco resolvem. O investimento mais urgente é na formação profissional e cultural dos professores.

E de que adianta a escola ter luz elétrica e computadores se a violência estiver instalada ali? Onde deveríamos ensinar e aprender, entre outros valores, os da cidadania, da convivência e do respeito mútuo, acaba por imperar o medo.

Neste ponto, Ioschpe evitou procurar com diligência a "frieza" dos dados. Pois são muitos e chegam a gelar a alma. Dentro das escolas há vandalismo, violência física entre alunos, ameaças a professores e funcionários, consumo e tráfico de drogas. Em 1999, 82% de 520 escolas estaduais de São Paulo sofreram algum tipo de violência, conforme o estudo Violência nas escolas, do Sindicato de Especialistas em Educação do Magistério Oficial do Estado de São Paulo. Depredações a móveis, lâmpadas, vidros e outros objetos aconteceram em 72% das escolas; brigas (62%), pichações (53%) e casos de explosões de bombas (48%) em banheiros ou telhados da escola.

Autênticas "regalias"

Pesquisa da Unesco (2002/3) mostra que existe violência em 83,4% das escolas brasileiras. Os furtos ocorrem em 69,4% delas. O artigo de Ioschpe traz uma foto cuja legenda ("Patrulha na porta de uma escola em São Paulo") foi escrita para gerar sensação de alívio: "Ufa, agora estamos a salvo!" Que a patrulha seja necessária demonstra que o problema da violência é real, e grave.

E há ainda sutilezas que as estatísticas, coitadas, não alcançam. Em pesquisas acadêmicas menos fascinadas pelos números e mais atentas à complexidade do real, percebe-se que o fato de alunos e professores verem armas dentro da escola não leva necessariamente à consideração de que exista violência no espaço escolar. É tão "normal", é tão "natural" ver canivetes, facas e até revólveres nas mãos de alunos que perde força a associação entre armas e violência.

O articulista refere-se, então, ao salário do professor. Admite que "o professor brasileiro tem um salário absoluto baixo" porque, afinal, é brasileiro, como brasileiros e com baixos salários são os nossos médicos, carteiros, bancários, jornalistas etc. Mais ainda: o salário dos professores é até melhor, em comparação com o de outras categorias, quando se leva em conta diferença de férias e aposentadoria (no caso dos servidores públicos), autênticas "regalias". E em comparação com o rendimento dos professores da OCDE e da América do Sul, também o professor brasileiro estaria em situação vantajosa.

O salário médio

No entanto, esses não são os únicos dados e raciocínios em jogo.

Para já, o salário do professor não está destinado apenas aos itens da sobrevivência de um "cidadão comum". Além da alimentação, habitação, vestuário, saúde, transporte, estudo dos filhos, lazer etc., o professor precisa investir numa vida pessoal de estudo contínuo e de contínua inserção na cultura. É preciso adquirir livros, assinar revistas, jornais (e dispor de tempo para lê-los), participar de cursos e seminários, ir ao cinema, ao teatro, viajar, ter um bom computador e estar conectado à internet.

Se há aumentos salariais que garantam a cesta básica, ótimo, mas o impacto desses aumentos no aperfeiçoamento humano, intelectual e profissional do professor será mínimo. O aumento salarial que um professor consciente exige terá esses dois objetivos: primeiramente, sobreviver, o que se agradece, mas também poder viver como profissional do conhecimento e tudo o que isso implica.

Analisa-se mal a complexa questão da remuneração docente se não se pensa nas diferenças regionais e nas diferenças dentro da própria categoria. Não é incomum encontrarmos em Recife, para mencionar capital importante do Nordeste, um professor trabalhando em dois colégios privados de ensino médio, com formação em nível superior, com salário de R$ 1.000. Conseguirá sobreviver, mas nem sobreviver talvez consiga o outro professor pernambucano, sem ensino superior, que trabalha em cidade pequena ganhando R$ 1,00 a hora-aula.

Mas quanto recebe o professor brasileiro, afinal? A média nacional gira em torno de R$ 4,00 a hora-aula entre professores sem ensino superior. Os que têm diploma universitário recebem em média R$ 6,00 a hora-aula. O valor da hora-aula não é o mesmo no território nacional. Conforme a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), o piso inicial de um professor estadual com ensino superior oscila entre R$ 4,62 no Piauí, R$ 4,46 no Ceará, e R$ 13,16 no Acre e R$ 12,89 em Roraima.

Dados escolhidos a dedo

Gustavo Ioschpe conclui:

"A mitificação do nosso professor impede que o vejamos como ele é: um profissional, adulto, consciente de suas decisões e potencialidades, inserido em uma categoria profissional que, como todas as outras, abriga muita gente competente, muita gente incompetente e muitos outros medíocres e que, portanto, deve receber não apenas encorajamento e defesa condescendentes, mas também cobranças e críticas construtivas e avaliações objetivas de seus méritos e falhas. Só assim melhoraremos o desempenho das nossas escolas e daremos um futuro ao país."

Que entre os docentes haja profissionais competentes, incompetentes ou medíocres é uma daquelas obviedades que nada explica. O parágrafo, na verdade, faz uma acusação: os professores, com a conivência da mídia, alimentam o vitimismo, fingem ser pobres coitados, para que ninguém se lembre de lhes fazer exigências.

Se a avaliação objetiva da atuação docente e a cobrança de resultados são a única forma de melhorar o desempenho da escola, supõe-se que não haja obstáculos ou dificuldades externas. Vivemos, segundo o jovem economista, no melhor dos mundos educacionais. Tudo dependeria de o professor tornar-se mais responsável. Esta imagem de um professor que se queixa de barriga cheia é a que o articulista da Veja nos apresenta e na qual ele parece acreditar piamente, baseado em números e dados estatísticos selecionados a dedo...